Literatura

As Crônicas de Gelo e Fogo – A Fúria dos Reis: a genialidade da boa literatura

Quando terminei a última página de A Fúria dos Reis senti uma vontade imensa de dizer: “cascalho, cadê a porra do livro A Tormenta das Espadas?” É isso mesmo. Você devora cada página, cada capítulo, ansiando verdadeiramente pelo fim do livro, mas com a sensação amarga e tristonha de que a continuação não está em suas mãos e por isso vale a pena brecar, ler mais devagar para poder apreciar melhor todo o rico universo de fantasia criado por George R. R. Martin. Eu tentei fazer isso. Pela Força, como tentei! Mas foi muito difícil. Até minha mãe, contumaz devoradora de livros com temática espírita, quando se deparou com A Guerra dos Tronos e A Fúria dos Reis não conseguiu mais parar de ler. Verdade seja dita: George R. R. Martin tem algum tipo de pacto com Melisandre e o Senhor da Luz: nos fisga a atenção e fica muito, mas muito dificil se desprender desse universo do que há de melhor na literatura de fantasia. Segue uma breve resenha com spoilers.

A trama de A Fúria dos Reis segue diretamente os eventos ocorridos em A Guerra dos Tronos. Robb Stark foi declarado Rei do Norte. Joffrey Lannister (filho incestuoso da Rainha Cersei com seu irmão Jaime Lannister) continua a promover atrocidades com seus súditos e a promover uma contínua violência contra Sansa Stark, a doce e ingênua Stark ainda sob guarda da Rainha Cersei e de seu mimado e imbecil filho-Rei Joffrey, Arya Stark perambula, buscando fugir do domínio Lannister em Porto Real, Bran descobre-se cada vez mais homem e menos criança, Jon Snow continua a se desenvolver como irmão da Patrulha da Noite e Daenerys Targaryen – mãe de Dragões segue com sua busca de encontrar meios de retomar sua herança: o Trono de Ferro e Tyrion Lannister, bom, Tyrion segue no malabarismo que sua vida de anão lhe impõe, tentando, a seu modo, se equilibrar num mundo cada vez mais louco e dificil de entender.

E justamente esse mundo louco e dificil de entender ganha, em A Fúria dos Reis, uma dimensão cada vez mais mágica. Os indicativos já existiam, no momento que os dragões ganham vida, a magia que há muito desaparecia retorna, forte e poderosa. Alguns dos protagonistas sentem isso mais do que outros, mas todos e todas são ou serão atingidos por essa nova realidade. O que me faz pensar, novamente, em Tyrion Lannister. Tenho dúvidas, desde A Guerra dos Tronos, em qual personagem gosto mais: Tyrion, Jon ou Arya. Em A Fúria dos Reis, Tyrion ganha um espaço muito maior na trama, talvez por ser empossado como Mão do Rei, ainda que uma mão postiça e meio torta. Suas passagens pela história são recheadas de sentimentos como honra, raiva, temor e mesmo amor. E tudo isso num anão, é a ironia que ele mesmo sente. E talvez Tyrion, ao lado de Jon Snow, seja o personagem mais honrado num mundo que se desmancha diante do surgimento de Reis a cada amanhecer. Fico a imaginar se George R. R. Martin racionalizou isto: bastardos e anões e corsários (o personagem Davos surge e é interessantissimo, como cavaleiro ex-contrabandista do Rei Stannis) são aqueles personagens que tentam deter, aos seus respectivos modos, a maré de loucura que toma a todos e todas. Mas a vida impõe regras e restriçoes e preços e atingem, inclusive, aqueles personagens que, numa literatura média, seriam salvos disto. Decisões dificeis além de serem tomadas, são necessitadas continuamente. E a traição ronda como um leão que ruge de fome, muitas vezes um leão Lannister, como Tyrion descobre amargamente.

George R. R. Martin nos prende em suas páginas e capítulos com o melhor que uma trama política tem a oferecer: a realidade de quem vive essa política. Como no livro anterior, A Guerra dos Tronos, a Fúria dos Reis é permeada pela busca do poder, com todo o seu preço. Seja Daenerys, ansiando por retomar a realeza dos Targaryen, ou Theon “Vira-Casacas”, buscar poder pode levar a perda da honra, especialmente quanto a Theon, ou então a suscetibilidade da traição, como amargamente provou Daenerys. A política é a face crua da realidade que permeia todos os personagens de A Fúria dos Reis, mas especialmente neste livro George R. R. Martin presentea-nos com uma magia misteriosa, que engana os olhos dos personagens e nos incute as mais terríveis dúvidas sobre sua realidade ou não. A magia, em A Fúria dos Reis, também está nos detalhes, ao contrário da pesada realidade da política e Arya Stark vivencia essa experiência.

Magia e Religião em Westeros voltam a se unir na Fúria dos Reis, de forma direta através da misteriosa Melisandre, uma espécie de sacerdotisa do Senhor da Luz a serviço do Rei Stannis Baratheon. E ela oferece uma pergunta simples, mas um pouco salgada: qual o preço disposto a pagar pelo poder?

Ao longo da história da humanidade a religião foi utilizada como um instrumento de serviço ao poder. Sua institucionalização serviu para dar unidade a um povo e a separar “nós e eles”. O Rei Stannis Baratheon aceita essa estratégia e perde sua honra com ela e apenas um contrabandista o alerta quanto a isso. Pergunta-se, Davos, então: que mundo é este que a honra cabe a um contrabandista?

É o mundo em transformação de Westeros. E que A Tormenta das Espadas venha o quanto antes! E como aperitivo para a série Game of Thrones pela HBO os 14 primeiros minutos do episódio inicial. E legendando, para aqueles não familiarizados com o inglês e nem o ingreis creyssonês!


 

 

21 pensamentos sobre “As Crônicas de Gelo e Fogo – A Fúria dos Reis: a genialidade da boa literatura

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  2. Estou doido para ler os livros. Neste momento estou (finalmente) lendo A sociedade do Anel, do Tolkien. Imagino que deva ser no mesmo estilo. Por hora assistirei à série.

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    • Vinícius, acho As Cronicas de Gelo e Fogo – Guerra dos Tronos e A Fúria dos Reis – melhor que O Senhor dos Anéis, mas é gosto!!! vale muito a pena ler, de qualquer forma ambas as obras!!!!

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  3. Boa análise do livro, que é realmente uma obra incrível. E o mais legal é dizer que o próximo livro, A Tormenta de Espadas, é o ápice da série por enquanto – você não perde por esperar. O inverno está chegando MESMO.

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    • Estou ansioso, Andre, pelo livro A Tormente de Espadas. Como comecei a coleção pela edição brasileira da Leya, vou ter de me segurar para não comprar antes de lançarem aqui no Brasil!

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    • Igor, tem uma conversa que A Tormenta das Espadas sairá por volta de Agosto/Setembro. Mas é melhor esperar para ver. Ao menos a Editora Leya sabe que publicar a série está compensando e muito do ponto de vista financeiro…

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  7. Uma dúvida, esse livro é a continuação da série da HBO? Vi a primeira temporada e estou atormentado para ler o livro… que continue a história! Enfim, se eu seguir nesse livro em diante, tem continuidade?

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    • Thiago, meu caro, tem sim. A série da HBO é baseada nos livros das Crônicas de Gelo e Fogo de autoria de George R. R. Martin. O primeiro livro foi traduzido como “A Guerra dos Tronos” e nele foi baseada a primeira temporada da série da HBO. A continuação foi traduzida como “A Fúria dos Reis” e será a segunda temporada da série da HBO. Ambos os livros foram publicados pela editora Leya, no Brasil, e recomendo fortemente ler os livros e então assistir a série de TV. Em setembro agora será lançada o terceiro livro das Crônicas de Gelo e Fogo intitulado no Brasil como “A Tormenta de Espadas” que corresponderá a futura terceira temporada da série da HBO (se tudo der certo). É isso. Material de primeira!!! Grande Abraço!

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  9. Estou triste …. me parece que a casa mais honrada na história
    sempre se da mal ..
    Acabei de ler o trecho em que Theon … bom deixa para la
    perdi um pouco a vontade de ler, mas jaja ela volta

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    • bom a traição de theon greyjoy, já era esperada. o interessante era saber como se daria isto na trama. eu particularmente achava que seria por dayeneres. mas não sei como ocorreu pois não li o segundo livro ainda.

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  10. bom gostei muito de sua analize as eu diria que tyrion não nego é um ser interessante porem nada honrrado, tudo que lhe interessa é a propria pele e sendo um anão. seu instinto de sobrevivencia é muito maior. mas é opinião minha. obg

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